O advogado que já esteve no presídio, que acompanha de perto a rotina das delegacias, que conhece o sentimento de desespero dos pais e mães que perdem o poder pátrio de seus filhos e lutam para tê-los de volta e que convive todos os dias com as agruras e as justiças e injustiças do mundo, tem um outro olhar, mais humanizado, sobre o Direito e também sobre a pilha de processos que se acumulam nos Tribunais de Justiça. É isto que justifica a presença do advogado dentro do Judiciário hoje, por meio do chamado quinto constitucional.
Esta foi a posição defendida pela desembargadora Salete Sommariva, representante do quinto constitucional, que palestrou em Brusque no fim da manhã desta terça-feira (23), último dia de programação da 17ª Conferência Estadual dos Advogados. O painel foi coordenado pelo presidente da subseção de Itapema, Jean Leomar Pereira, e teve também a presença dos conselheiros estaduais Agenor Acácio Pacheco, Eduardo Pizzolatti Miranda Ramos e Fabrício Bittencourt.
Para Salete, o advogado que assume uma vaga no TJ pelo quinto constitucional não está ali por comodidade: ele também passou por duras provas. No momento em que é aceito é porque teve uma história, foi sabatinado e se mostrou um profissional combativo e defensor das prerrogativas da advocacia.
O quinto constitucional, que atravessou oito décadas e foi legitimado por tantos governos e regimes, é também instrumento de democracia e uma forma de oxigenar os tribunais, pelo fato de trazer posições diversas e mais amplas sobre os casos que chegam ao Judiciário – que, às vezes, sofre de determinados vícios que impedem uma visão mais humanizada e prática da vida em sociedade, como a dificuldade dos magistrados em exercer suas funções sem sair dos gabinetes e a chegada de novos profissionais cada vez mais jovens, com pouca experiência de vida e vivência profissional. “Um juiz e um desembargador não são apenas um cabedal de conhecimentos técnicos e jurídicos. A eles cabe muito mais: precisa ter consciência social, saber as mazelas que acontecem lá fora e as desigualdades sociais e culturais que desgraçam nosso país”, salienta.
E este é o diferencial do advogado dentro do grupo. Ele não vê os milhares de processos apenas como um amontoado de papéis: sabe que ali existem expectativas sobre algo a ser mudado, lágrimas por coisas perdidas ou esperanças de alguém que ainda espera por justiça. “Não é apenas buscar código e proferir uma decisão. Claro, o magistrado não pode fugir ao texto frio da lei, mas ele pode adaptá-la à justiça”. É o caso, por exemplo, da Câmara Criminal, onde Salete está lotada há 12 anos. De acordo com ela, a dignidade carcerária do detento, a vida digna na prisão, é a única forma de coibir a violência que existe hoje: só assim, eles poderão ter uma direção, um trabalho e uma nova chance de recomeçar quando estiverem livres, para que a reincidência continue diminuindo. “Isso é meu lado de advogada que faz. Estou lutando por uma causa que acho justa”, salienta.
Já o desembargador Fernando Carioni, o mais antigo dos profissionais do quinto constitucional no Estado, alertou para a interferência, cada vez mais presente, do poder executivo dentro das decisões do TJ, orientando a forma como deve ser feito o julgamento. “Não pode haver intromissão em nenhum dos lados. É uma pretensão muito grande, um retrocesso. É como voltar à época dos romanos, que basearam o Direito mundial”, salienta o desembargador, que também já presidiu a Seccional da OAB em Santa Catarina.
Carioni também demonstrou sua preocupação a respeito das súmulas vinculantes que estão se tornando comuns dentro do STF – existem 33 hoje –, o que, para ele, foge da função restrita do Judiciário em interpretar e aplicar leis e avança para o lado legislativo, criando novas regras. “Acredito muito na força dos tribunais federais e estaduais, mas tenho minhas dúvidas quanto as situações que têm interpretação diferenciada no STF”, concluiu.
Assessoria de Comunicação da OAB/SC