Com objetivo de apresentar os princípios e valores da Justiça Restaurativa, a OAB/SC receberá a psicóloga Monica Mumme, na próxima terça-feira (22), para ministrar a palestra “Justiça Restaurativa: um convite ao diálogo social”, promovida pela Comissão da Criança e do Adolescente. A psicóloga foi responsável pela implementação de políticas públicas em Justiça Restaurativa em diversas cidades e coordena projetos sobre convivência justa e pacífica. A metodologia é incentivada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por meio do Protocolo de Cooperação para a difusão da Justiça Restaurativa, firmado com a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). A palestra será realizada no Auditório da Seccional, às 19h. Mais informações, aqui.
OAB/SC: A prática da Justiça Restaurativa ainda uma novidade no país?
Monica Mumme: Não, não é uma novidade se a gente pensar que ela tem 12 anos e já avançou muito. Está em todos os estados do Brasil, com iniciativas que unem o judiciário, a escola, a assistência social, as medidas socioeducativas e trabalhos em penitenciárias. A Justiça Restaurativa está conseguindo trazer uma nova perspectiva para a lógica punitiva e convidando as instituições a transitarem para uma lógica de responsabilização, que é o princípio fundante dessa metodologia. Agora, se pensarmos em uma perspectiva mais ampliada, ela ainda é pouco conhecida, por isso a importância de um exercício permanente de divulgação, disseminação e produção de conhecimento acerca da Justiça Restaurativa.
OAB/SC: Como surgiu e o que falta para ser mais utilizada pelo sistema judiciário?
Monica Mumme: Me parece que a gente está investigando como trazer esses princípios e esses valores da Justiça Restaurativa para o dia a dia das instituições. Originalmente nasce de ações comunitárias, por isso, algumas pessoas entendem que deveria permanecer nesse ambiente comunitário. Outras pessoas entendem que a Justiça Restaurativa é do sistema de justiça, que é propícia para o sistema de justiça e o que se faz fora são práticas restaurativas. Na concepção do Laboratório de Convivência, que é a empresa de consultoria em que atuo e que está desenvolvendo trabalhos em Santa Catarina nesse momento, a gente compreende que a Justiça Restaurativa trabalha com o valor de justiça e o valor de justiça está no humano e aonde o humano está.
OAB/SC: Como funciona a mediação nesse método? Quais profissionais podem atuar com essa metodologia e qual o papel do profissional da advocacia?
Monica Mumme: Existem procedimentos restaurativos, que trazem os princípios, os valores e os conceitos da Justiça Restaurativa, que buscam transitar de um procedimento com foco na proibição para um resgate da responsabilidade individual e coletiva. A pessoa que trabalha com círculos de construção de paz e círculos restaurativos, ou seja, os diferentes procedimentos, ela precisa se preparar para que, a partir dessa técnica, ela ajude as pessoas a acessarem suas histórias, seus contextos e falem da situação ocorrida de fato. Como que, a partir dessa situação, novas construções de relação podem acontecer. Como que os comportamentos anteriormente praticados, que produziram uma violência, podem ser observados com consciência.
As pessoas não mudam seus padrões porque houve uma determinação, por isso buscamos dar vez e voz, em uma dinâmica ordenada, para trabalhar aspectos mais subjetivos e transitar para aspectos mais objetivos. Esse aspecto objetivo é um plano de ação ou um combinado de como que as pessoas podem lidar diferente com o fato ocorrido. Também observamos a vítima, quais são as necessidades dela? O que ela sentiu com a situação que ela experimentou naquele momento? O que ela precisa? O que é necessário para ela lidar com o que ela viveu? Por que o que aconteceu, aconteceu, não vai mudar, mas dali em diante pode se modificar.
Para quem cometeu o ato é importante ouvir os impactos que foram causados na outra pessoa com sua atitude. As pessoas diretamente e as demais pessoas indiretamente envolvidas na questão também falam dos seus sentimentos, das suas necessidades, e do que podem oferecer para que essa situação se modifique. Pretendemos devolver para um coletivo o senso de comunidade, de que é possível transformar ações violentas a partir de um potencial criativo, de uma nova forma de conviver. Não é passar a mão na cabeça de ninguém, não é desculpar ninguém e não é perdoar. É trazer consciência sobre o ato cometido.
No que se refere aos profissionais do direito, isso é fundamental. São profissionais que podem levar essa proposta antes de judicializar questões. Sabemos que, muitas vezes, estão sendo judicializadas por causa de sentimentos e não de aspectos tão objetivos. Por isso, o método da Justiça Restaurativa tende a devolver às pessoas as possibilidades e competências que elas tem para lidar com esses sentimentos. Advogadas e advogados são profissionais fundamentais para que essa cultura se modifique, para que uma nova forma de lidar com a justiça possa estar presente no dia a dia das pessoas. Não é ir contra o sistema de justiça, de forma nenhuma, mas é entender o que realmente é necessário que seja tratado em um sistema de justiça. A Justiça Restaurativa tem força de resolução.
OAB/SC: Qual é a diferença entre Justiça Restaurativa e conciliação?
Monica Mumme: Eu costumo fazer a seguinte imagem: a gente tem um terreno onde várias árvores estão frutificando. Ou seja, a Justiça Restaurativa, a conciliação, a mediação, as práticas colaborativas... Todas buscam o diálogo e o encontro a partir dessa escuta e dessa fala. Mas cada uma dessas árvores tem uma raiz que dá contorno àquilo que é o seu procedimento. Então, a JR, em minha percepção , traz um conjunto de ações, é uma filosofia, é uma forma de pensar e estar no mundo, no sentido de um conjunto sistêmico, ordenado, que traz muitos elementos. Não é apenas um procedimento, a JR nos convida a olhar para a responsabilidade coletiva e convida a uma rede de articulação. Não colocamos apenas duas pessoas - agressor e vítima -, inserimos essas pessoas mais um coletivo, formado por outras pessoas indiretamente envolvidas e apoios que podem trazer possibilidade de uma nova forma de convivência. Nesse sentido vejo a diferença com a conciliação, que normalmente trabalha com ofensor e vítima diretamente.
Assessoria de Comunicação da OAB/SC